Enfrentar os impactos das mudanças climáticas, com medidas de adaptação e mitigação das emissões de gases de efeito estufa, exigirá esforços em todos os setores: a academia precisará de um enfoque mais multidisciplinar, o governo deverá se sensibilizar para a urgência do tema e a sociedade terá que compreender a necessidade de uma profunda mudança cultural.
Esses desafios foram debatidos nesta terça-feira (21) por cientistas e formuladores de políticas públicas no Painel Internacional de Especialistas em Megacidades, Vulnerabilidade e Mudança Climática Global, na sede da FAPESP, em São Paulo.
O evento, liderado pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), tem o objetivo de traçar um mapa das vulnerabilidades das regiões metropolitanas de São Paulo e do Rio de Janeiro frente aos efeitos do aquecimento global, com o objetivo de subsidiar políticas públicas de adaptação às mudanças climáticas.
Segundo o coordenador do Fórum Paulista de Mudanças Climáticas Globais, Fábio Feldman, a criação dos fóruns estaduais, em 2005, foi um avanço que permitiu aos estados uma maior articulação com as políticas municipais e federais. Ainda assim, prevalecem as dificuldades históricas na implantação de políticas nacionais relacionadas ao clima.
“Há dificuldades dos governantes para compreender que o clima é um tema para hoje, não para daqui a 20 anos. No Ministério da Ciência e Tecnologia, por exemplo, a estrutura para trabalhar nesse tema é muito pequena, mantendo o mesmo número de pessoas há mais de 15 anos”, disse.
Segundo ele, as principais propostas dos fóruns têm foco na elaboração de marcos regulatórios relacionados às mudanças climáticas em todos os níveis de governo. “Em São Paulo elaboramos uma política para criar um processo – ou seja, incluir na agenda governamental a obrigatoriedade de inventários e mapas de vulnerabilidades. Acreditamos que isso vá mobilizar a sociedade brasileira para um avanço concreto”, explicou.
Feldman declarou que há grandes dificuldades políticas para o estabelecimento de metas de emissões de gases de efeito estufa. “O problema é que as metas são entendidas como punição e não como oportunidade de inovação tecnológica”, afirmou.
Outra dificuldade importante no Brasil, segundo Feldman, é articular as políticas públicas de clima com políticas setoriais como as de transportes e saúde. Um exemplo disso, segundo ele, é a redução dramática do imposto sobre produtos industrializados (IPI) concedida pelo governo brasileiro, por causa da crise financeira.
“Com essa redução do IPI teremos uma imensa frota renovada de caminhões. Mas perdemos a oportunidade de articular essa iniciativa com as políticas climáticas, já que essa renovação será feita com uma tecnologia atrasada do ponto de vista do padrão de emissões. O padrão do diesel comercializado no Brasil é muito ruim, comparável apenas a alguns países da África”, declarou.
Segundo Feldman, a legislação não conseguirá, por si só, implantar as políticas de adaptação e mitigação. “Os dois avanços em políticas ambientais mais importantes que surgiram nos últimos anos foram o indicador de sustentabilidade ambiental da Bovespa e a decisão das redes de supermercados de só comprar carne com rastreabilidade, para evitar os produtos que devastem a Amazônia. Esses dois avanços não envolveram legislação”, disse.
Mudança cultural - O presidente da Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental (Cetesb), Fernando Rei, afirmou que propor medidas de adaptação e mitigação implica uma mudança cultural que, muitas vezes, é rechaçada pela sociedade.
“Muita gente acha que vai haver alguma revolução tecnológica que nos permitirá manter os atuais níveis de consumo. Há uma grande dificuldade da academia e dos órgãos ambientais para se confrontar com esse tipo de contrapropaganda”, disse Rei.
Para Rei, a resistência à mudança de hábitos por parte dos cidadãos indica que há uma tendência de transferir as responsabilidades ao poder público. “Embora a Constituição Cidadã já tenha completado 21 anos, seguimos construindo um projeto de nação no qual o cidadão tem muito poucos deveres. A Carta Magna, no entanto, destaca o compromisso da coletividade e do poder público na preservação da qualidade ambiental”, declarou.
Segundo Rei, é preciso também que a academia trate o problema do clima de forma mais multidisciplinar. “Nosso processo de ensino encaminha os alunos para um universo de certezas. Não geramos na academia alunos que trabalhem com dúvidas. A burocracia acadêmica dificulta a construção de um olhar científico multidisciplinar. No entanto, o tema da mudança climática é essencialmente multidisciplinar e, por isso, será preciso repensar a forma de se produzir conhecimento”, disse.
Rei afirmou que, em sua avaliação, as principais vulnerabilidades na Região Metropolitana de São Paulo dizem respeito à questão da saúde – com novos vetores de epidemias e qualidade da saúde pública – e ocupações em áreas sensíveis, especialmente em torno de mananciais.
“Para combater a ameaça que essas vulnerabilidades representam com a possível ocorrência de eventos extremos, será preciso discutir as políticas públicas. Mas temos perdido a oportunidade de fazer isso porque o mercado e a sociedade estão ainda muito ausentes do debate. Essa não pode ser uma discussão exclusiva da academia e do poder público”, declarou.
(Fonte: Fábio de Castro/ Agência Fapesp)
Esses desafios foram debatidos nesta terça-feira (21) por cientistas e formuladores de políticas públicas no Painel Internacional de Especialistas em Megacidades, Vulnerabilidade e Mudança Climática Global, na sede da FAPESP, em São Paulo.
O evento, liderado pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), tem o objetivo de traçar um mapa das vulnerabilidades das regiões metropolitanas de São Paulo e do Rio de Janeiro frente aos efeitos do aquecimento global, com o objetivo de subsidiar políticas públicas de adaptação às mudanças climáticas.
Segundo o coordenador do Fórum Paulista de Mudanças Climáticas Globais, Fábio Feldman, a criação dos fóruns estaduais, em 2005, foi um avanço que permitiu aos estados uma maior articulação com as políticas municipais e federais. Ainda assim, prevalecem as dificuldades históricas na implantação de políticas nacionais relacionadas ao clima.
“Há dificuldades dos governantes para compreender que o clima é um tema para hoje, não para daqui a 20 anos. No Ministério da Ciência e Tecnologia, por exemplo, a estrutura para trabalhar nesse tema é muito pequena, mantendo o mesmo número de pessoas há mais de 15 anos”, disse.
Segundo ele, as principais propostas dos fóruns têm foco na elaboração de marcos regulatórios relacionados às mudanças climáticas em todos os níveis de governo. “Em São Paulo elaboramos uma política para criar um processo – ou seja, incluir na agenda governamental a obrigatoriedade de inventários e mapas de vulnerabilidades. Acreditamos que isso vá mobilizar a sociedade brasileira para um avanço concreto”, explicou.
Feldman declarou que há grandes dificuldades políticas para o estabelecimento de metas de emissões de gases de efeito estufa. “O problema é que as metas são entendidas como punição e não como oportunidade de inovação tecnológica”, afirmou.
Outra dificuldade importante no Brasil, segundo Feldman, é articular as políticas públicas de clima com políticas setoriais como as de transportes e saúde. Um exemplo disso, segundo ele, é a redução dramática do imposto sobre produtos industrializados (IPI) concedida pelo governo brasileiro, por causa da crise financeira.
“Com essa redução do IPI teremos uma imensa frota renovada de caminhões. Mas perdemos a oportunidade de articular essa iniciativa com as políticas climáticas, já que essa renovação será feita com uma tecnologia atrasada do ponto de vista do padrão de emissões. O padrão do diesel comercializado no Brasil é muito ruim, comparável apenas a alguns países da África”, declarou.
Segundo Feldman, a legislação não conseguirá, por si só, implantar as políticas de adaptação e mitigação. “Os dois avanços em políticas ambientais mais importantes que surgiram nos últimos anos foram o indicador de sustentabilidade ambiental da Bovespa e a decisão das redes de supermercados de só comprar carne com rastreabilidade, para evitar os produtos que devastem a Amazônia. Esses dois avanços não envolveram legislação”, disse.
Mudança cultural - O presidente da Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental (Cetesb), Fernando Rei, afirmou que propor medidas de adaptação e mitigação implica uma mudança cultural que, muitas vezes, é rechaçada pela sociedade.
“Muita gente acha que vai haver alguma revolução tecnológica que nos permitirá manter os atuais níveis de consumo. Há uma grande dificuldade da academia e dos órgãos ambientais para se confrontar com esse tipo de contrapropaganda”, disse Rei.
Para Rei, a resistência à mudança de hábitos por parte dos cidadãos indica que há uma tendência de transferir as responsabilidades ao poder público. “Embora a Constituição Cidadã já tenha completado 21 anos, seguimos construindo um projeto de nação no qual o cidadão tem muito poucos deveres. A Carta Magna, no entanto, destaca o compromisso da coletividade e do poder público na preservação da qualidade ambiental”, declarou.
Segundo Rei, é preciso também que a academia trate o problema do clima de forma mais multidisciplinar. “Nosso processo de ensino encaminha os alunos para um universo de certezas. Não geramos na academia alunos que trabalhem com dúvidas. A burocracia acadêmica dificulta a construção de um olhar científico multidisciplinar. No entanto, o tema da mudança climática é essencialmente multidisciplinar e, por isso, será preciso repensar a forma de se produzir conhecimento”, disse.
Rei afirmou que, em sua avaliação, as principais vulnerabilidades na Região Metropolitana de São Paulo dizem respeito à questão da saúde – com novos vetores de epidemias e qualidade da saúde pública – e ocupações em áreas sensíveis, especialmente em torno de mananciais.
“Para combater a ameaça que essas vulnerabilidades representam com a possível ocorrência de eventos extremos, será preciso discutir as políticas públicas. Mas temos perdido a oportunidade de fazer isso porque o mercado e a sociedade estão ainda muito ausentes do debate. Essa não pode ser uma discussão exclusiva da academia e do poder público”, declarou.
(Fonte: Fábio de Castro/ Agência Fapesp)
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